quinta-feira, agosto 17, 2006

Aguento, aguento, aguento?

Com uma palavra dita-se o fim: cancela. O mesmo que não venhas. O mesmo que aqui não passas. Alguém retira a doçura às palavras e rebenta connosco. É uma chatice quando o nosso melhor não chega. É uma dor, ver cair o breve instante da ilusão de uma eternidade. Se estivesse em casa, tinha um amigo para me abraçar a tristeza, e deita-la a dormir, para que a seguir dormisse eu também. Mas estou em Macau. Sobra um banco e poucas estrelas no céu. Eu choro, e o mundo infelizmente não acaba. Eles não sabem e a vida continua na ponte, fora de nós. Aprende-se a morrer na quarta e a trabalhar na quinta. Aprende-se que as pessoas não se abraçam aqui. Aprende-se a curar a ternura ao telefone, com quem nos pode ouvir e inventar um ombro. Lembramo-nos que os amigos estão lá, e que aqui, estamos sozinhos. Há muito tempo.

"aguento aguento aguento
aguento o desejo que ferve
ponho-lhe água
apago-o um instante
deixo-o estar sossegado
à espera de nada.
aguento aguento
aguento o sonho
ponho-o com dono
finjo que não o sonho.
aguento
aguento a ternura
que já não tem cura
escondo-a, pura.
aguento
?"

m.f.

1 comentário:

Krapp disse...

«The night was very dark. It's true that the stars shone, but their light wasn't helpful. You could not make anything out. Maybe there was a tree right here, or maybe a lion, or maybe an elephant, or maybe nothing. But then the moon rose and it became light. Then a cliff sprung into view, and the cave in the cliff, and the field to the left, the river to the right, and the forest over the river.

From the cave two apes emerged on all fours. They rose, stood on their hind legs, and began walking unsteadily, swaying their long arms.»
["CAN YOU THROW A ROCK AS FAR AS THE MOON?" by Daniil Kharms]