domingo, abril 22, 2007

Requiem pela Velha Cabra*...Capa negra de saudade!


Acabei de fazer uma coisa da qual já me arrependi...mas, nem arrisco dizer o meu " nunca mais...", que pela boca já este peixinho morreu muitas vezes!...
Até aqui, nada de novo!... Não são raras as vezes em que penso depois de agir...faz parte do "package elsiano": a rapidez estonteante do agir é um reflexo condicionado pela lentidão avassaladora no pensar!...
De todo o modo, já me habituei e assumo-o, de resto, sem qualquer pudor! Sabem-no os meus pais, os meus amigos e, em geral, quem gosta de mim!!!
Ainda recordo, como se fosse hoje, o dia em que fiz o piercing na sobrancelha esquerda...foi em 1997, estava no 3.º ano da faculdade de Direito ... Caramba, já passou uma década!!! Estou uma verdadeira cota radical!!! ;o)))
Mas voltando ao dia em que "espetei o prego no sobrolho" (como diria um daqueles amigos com "A" maiúsculo, o ENORME João Nuno ;o)), não disse a ninguém! Quem me conhece sabe que é meu apanágio chocar (pela positiva, obviamente, muito embora a vida já me tenha ensinado bastas vezes que isto não são só rosas!...)
O certo é que sempre gostei de agitar as águas, sempre tive para mim que sou uma autêntica pedra no charco, daquelas que fazem um splash monumental e criam à sua volta um incontrolável e infindável número de ondinhas em círculo, estão a ver a imagem??? Sempre assim fui... Os meus pais reagiram bem...quer dizer, o pappi nem tanto, pois era meu patrono na altura e - convenhamos - ter uma filha estagiária de piercing sentada a seu lado, nas respeitáveis salas de audiências de julgamento, não é, de todo, politicamente correcto!!! Águas passadas, contudo, hoje não o faria, estou certa... Sobretudo pelo respeito que devo, enquanto agente do Direito, a essa Justiça Cega e Surda,personificada nas pessoas dos outros Advogados, Magistrados e digníssimos Juízes!
Limitar-me-ei a qualificar os tais juízos apriorísticos paternos como reflexos desse lugar tão-comum, que é a lacuna geracional entre Pais e Filhos, e que o TEMPO e o AMOR (esses estandartes que, incondicionalmente, nos situam), sempre logram suavizar...
A verdade nua e crua, contudo,- e pasmem! - é que foram bem mais duros na crítica os meus colegas de faculdade (supostamente "mais à frente"), do que a minha própria família ou os inigualáveis Jure Magisteres (demasiada e injustamente adjectivados de "antiquados"!) e que, pari pasu, sempre procuraram, tão esforçadamente, doutrinar-nos à luz dessa sarça ardente que é o bom nome daquela que é, já, uma Universidade Setecentista!!!
É um facto! As minhas melhores provas orais foram aquelas em que já exibia ostensivamente o piercing... Consigo recordar, in vivam memoriam , muitas dessas conversas com os doutos Professores Doutores, os quais tiveram a paciência de me aturar como discípula insistente! A verdade é que logrei concluir o meu bendito curso em 8 (oito) anos, ou em dois penosos séculos - como digo por graça -, porquanto ter-me matriculado no século XX (1993/94) e só ter saído licenciada em pleno século XXI (2000/01)!!!
Recordo com especial estima, hierarquicamente e por ordem de preferência, a saber:
Os catedráticos:
- o venerável e, para mim, incomparavelmente espirituoso e genial e tudo e tudo e tudo..., o verdadeiro jus-humanista BARBOSA DE MELO;
- o terno e humílimo jus-administrativista, VIEIRA DE ANDRADE (que, à parte as coincidências nomásticas, não é - hèlas! - meu familiar!...);
- o "ad semper" jus-romanista, SANTOS JUSTO;
- o magnífico jus-constitucionalista, GOMES CANOTILHO;
- o douto e eterno sedutor jus-civilista, CALVÃO DA SILVA;
- o ofuscante jus-criminalista FIGUEIREDO DIAS;
- o não menos brilhante jus-penalista COSTA ANDRADE;
- o já jubilado e bem-apessoado jus-historiador ALMEIDA COSTA;
- o paradigmático metodonomologista e jus-perfeccionista, PINTO BRONZE;
- a simplicidade e beleza cativantes da actualmente Directora do CEJ, a Prima-Donna Portuguesa a receber a Cátedra em Direito Penal, ANABELA MIRANDA RODRIGUES;
- o enigmaticamente simples jus-civilista, HENRIQUE MESQUITA
- o inteligentíssimo e supreendentemente bem-humorado jus-criminalista, a exercer presentemente o cargo de digníssimo presidente do Conselho Directivo da FDUC, FARIA COSTA ;
- o entusiástico jus-civilista, PINTO MONTEIRO;
- o jus-civilista timidamente retórico, SINDE MONTEIRO;

Permitir-me-ão, ainda, uma nota reverencial de agradecimento aos Venerandos Juízes do Tribunal Constitucional (TC):
- o sublime "escadote jurídico" (in litera e não só!), actualmente em funções como Presidente do TC, MOURA RAMOS;
- o já jubilado ex-Presidente do TC e Mestre de uma estarrecedora e fecunda oratória, CARDOSO DA COSTA;

E os restantes jutristas publicamente reconhecidos hão-de perdoar-me a respectiva preterição, mas gostos são gostos e os meus, como sói dizer-se em bom Português, não se discutem!...
Jamais esquecerei também, mesmo que a minha memória de elefante venha a atraiçoar-me...

[e desculpai, uma vez mais, a delonga deste post, embora por mim justificada, por esta, há muito devida e tardia, homenagem à ancestral Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC)...]

...o já desaparecido e, por isso, IMORTAL:

«ORLANDO DE CARVALHO»,

a quem considero, prostrada e de olhos no chão, e haveis de conceder nesta minha inevitável subjectividade!

O MAIOR JURISCONSULTO de todos os tempos!
Um GRANDE SENHOR do JUS UNIVERSAL!
HOMEM de uma BONDADE e HUMILDADE ímpares!
ÚNICO na sua INFINDÁVEL SABEDORIA, absoluta e imperscrutavelmente INSUPERÁVEL!
INATAS, a sua PHILOSOPHIA e ESTRANHA (porque INIMITÁVEL) FORMA de vida!

Queira, pois, Vossa Excelência, onde quer que Esteja...
- mas, por certo, Bem Melhor que nós, creio-o de firme FÉ! -
...aceitar esta minha singelíssima HOMENAGEM!

Tributo, só comparável àquele que pretendo render, sempre incondicional, à minha Família..., pelo resto dos meus dias, ao som das badaladas desse Tempo que passa - brando, mas inexorável -, afagando a minh'Alma Infinita e poupando-me ainda a voz deste Efémero Corpus!

E termino este requiem, agradecendo ainda e sem ordem de preferência: - aos Doutores: João Loureiro, Jónatas Machado e Mariano Pego;
- aos Mestres e Assistentes da FDUC: Pedro Caeiro, Mónica Jardim, Luís Mesquita, Filipe de Albuquerque Matos, Pedro Maia, Fernanda Paula de Oliveira, Paulo da Mota Pinto (ex-Juíz do TC), Nuno Castello Branco Bastos, Maria Manuel Gomes, Alexandre da Mota Pinto, Gorjão-Henriques da Cunha;
-aos alunos brilhantes do meu tempo, que tive o privilégio de conhecer enquanto colegas e que são, já, Mestres: Ana Margarida Gaudêncio, Dulce Lopes, Hugo Fonseca, Mafalda de Miranda Barbosa, Margarida Costa Andrade, Vasco Moura Ramos, Rosa Andreia Martins
And The Last...
-aos AMIGOS PESSOAIS,os quais estimo como se família fossem :
os Doutorandos, Paulo Henriques, José Eduardo Figueiredo Dias e Cristina Líbano Monteiro;
o Dr. Miguel Quental, monitor da FDUC e assistente na Universidade de Macau

...and definitely not at all the least:

ao AMIGO NON-STOP e irmão nas horas mais perras,
JOÃO NUNO CALVÃO da SILVA

E, já agora, antes de concluir, deixem-me confessar-vos o meu próprio espanto, porquanto poderia jurar não me lembrar de metade destas autênticas Personalidades Jurídicas - e esta é uma private joke para ti, PH! O facto, todavia, é que a "velha cabra", a despeito de não ter deixado muita saudade, logrou fazer de mim (e perdoar-me-ão a ostentação imodesta) a jurista que julgo ser hoje!!!
Recordo nostalgicamente, e para dar por finda esta lamechice pegada: - o "antigo bar dos Direitos" - malogrado "Pratas" - onde deixei, para sempre amarelecer, parte da minha gravata do traje;
-a sala de leitura da FDUC que, primeiro, escorria humidade pelas paredes e veio a transformar-se numa bela e moderníssima biblioteca; - os Gerais e respectivos Anfiteatros que ecoavam, grandiosos e assustadores...;
-o Bar, onde inevitavelmente passei a maioria do meu tempo de estudante, em tertúlias (tão fúteis, quanto produtivas), com colegas, professores e funcionários...
-O Bedel, insubstituivelmente personificado pelo já reformado "Varandas", que bradava literalmente aos céus, nas chamadas para as orais:
_"Teoriaaaaaaaaaaa Geral do Direito Civilllllllllllllll, 2.º anoooooooooooo: Elsa Vieiraaaaaaaaaaaa de Andradeeeeeeeeee Rodrigues - é a primeiraaaaaaaaaaaa, Instituto Jurídicooooooo!"
-e os impecáveis Archeiros que, a muito custo, nos comunicavam as notas no final das provas orais e que nunca nos abandonavam nos momentos de maior stress...
E agora, com os olhos rasos de lágrimas, reconstituo quase sem querer os tantos "pontapés (impedosos) que dei na raposa", representada num único azulejo - basicamente imperceptível ao lado de tantos outros pintados à mão e que embelezavam aquela Faculdade - colocado junto à entrada dos gerais pela Via Latina e que, supersticiosamente, se julgava prodigioso naquelas duras horas ...
-Tudo isto, para já não falar das sempre populares e inolvidáveis Latadas & Queimas, em que, invariavelmente, o "grãozito debaixo da asa" medrava, ao ritmo das malfadadas sebentas, dos "chumbos" e dos anos... Desse tempo guardo, orgulhosamente sós,
A capa de estudante, imunda da lama do velho e saudoso "Parque da Cidade" (palco de tantas noites bem passadas, quiçá, irrepetíveis em virtude da idade...), já carcomida pelos anos em cada um dos seus rasgões;
A pasta com as fitas encarquilhadas, assinadas pelas referidas Personalidades Jurídicas, pelos amigos, família e colegas...
E, por fim, essa intemporal Balada do 5.º Ano Jurídico, acompanhada pela belíssima guitarra de Coimbra!...porquanto ter sido a "banda sonora" do emocionante rasganço que celebrei com a minha grande amiga Joana Fonseca...assim que "sentimos que o tempo acabou.../Primavera de flor adormecida/Qualquer coisa que não volta, que voou.../Que foi um rio-mar na nossa vida..."
(vide complete lyrics in http://pedrolavado.no.sapo.pt/poemas.htm)

Estas e tantas outras lembranças são o que resta em mim, de Coimbra... Bons tempos, bons demais para arderem incendiados pelo rastilho dos dias breves...
E conto poder dizer um dia aos meus filhos como me diziam a mim: "_Eh estudantada, a festa é vossa!"
Um milhão de FRA's não seriam nunca suficientes para exaltar aquela que, não sendo minha mãe geográfica - a não menos encantadora cidade de Leiria enobrecida por um dos mais bonitos castelos do País! -, soube adoptar-me como filha legítima e será, hoje e sempre, a minha terra de eleição, elevada a Património da Humanidade, a emblemática Lusa Atenas!
Este texto é, pois, para ti cidade-mãe!...
Nunca permita o peso dos anos, a distância, nem a vida, enfim, turvar-te na minha memória ...
Do mais fundo que há em mim,
possa o meu último grito académico ser dedicado a Ti, COIMBRA...
Ahhhhh saudadeeeeeeeeeee!

(texto de inspiração Divina, na doce casa dos pais em Coimbra, 19.04.07, 18:08H)

*nome atribuído carinhosamente e por costume à ancestral Torre da Universidade de Coimbra, em virtude da designação dada ao sino que, qual coração da cidade, a anima incansável.

7 comentários:

Anónimo disse...

coimbra de facto uma cidade unica, por tudo. Macau, um lugar que se estranha e depois se entranha...
Mas coimbra sp no coraçao.

Anónimo disse...

Em cada palavra um reviver, uma lágrima de saudade...
Foi para mim uma honra poder partilhar ctgo alguns desses momentos inesquecíveis...

UM GRANDE BEIJO

Yāt go yàn 一個人 Yī gè rén disse...

é isso mesmo...coimbra deixa saudades que ficam para lá do tempo que passa...
E perdoar-me-ão os que não puderam, não quiseram ou não tiveram a sorte de aqui vir aprender, pois nunca saberão o que é Coimbra, na sua essência...a cidade dos estudantes, a nossa cidade-mãe!...

Anónimo disse...

Este post levou-me às lágrimas. Genial, como tu aliás!
A saudade desses doces tempos é tanta que por vezes dói.
Mas é sempre bom recordar e as tuas palavras levaram-de de volta ao nervosismo dos 20 anos e ao pânico miudinho que sentia quando o Varandas berrava os nossos nomes na chamada para as orais.
Obrigada por este momento e beijos grandes para esse lado do mundo!

Yāt go yàn 一個人 Yī gè rén disse...

Teresaaaaaaaaaaaa! Que é feito, mulher?
Ainda por cá ando, bem entendido por terras lusas!
Estou a viver na Figueira! - vê se apareces para matarmos saudades!
beijos grandes e obrigada por passares por aqui!
elsa

Anónimo disse...

Sim, Coimbra e a FDUC hão de fazer parte de nós para sempre...e recordar é viver.

Anónimo disse...

A Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra é uma saudosa lembrança, embora teimosamente arreigada em sua incansável metodologia teórica, persiste na pretensão de ser um misto de enfadonha e meticulosa que prepara teóricos do Direito e descura da vida jurídica prática.