quinta-feira, outubro 05, 2006

A lupa

O meu olhar assomou à janela e pegou no vislumbre da tua face...fico quieta e fujo. Quero chorar, só quero chorar. Sinto a tua falta, toda a tua falta. Mas temo relembrar que se estou aqui é porque havia algo a fazer, algo tinha de ser. Quem gostar de mim tem de ser por inteiro, descaradamente. Não vou ser menos do que sou por ti. Contigo aprendi a ser coisas que sou nunca fui...Chama-me. Grita o meu nome.
De novo, abriste-te atrás da porta.. perdi-me no segundo, só agarrei o teu olhar quando ele se sumiu atrás dos meus passos... tu e a tua infantaria... Tudo permanece, até este descontentamento, até o meu sorriso...
Já alguma vez contaste quanto tempo demora a apagar a palavra amor?
A lupa das desilusões, a previsão do futuro, a vida pensada para o coração.
“Pensas demais”, diz quem não intervém aritmeticamente na conversa e termina nesta frase simples e feroz, grandiosa eloquência desconhecida.. ainda se dissessem sonhas demais...eu entendia. As historias do coração, contadas, transformam-se nessas construções objectivas onde tentamos perceber o que falhou...
Simples: a dor, falhou a dor. Venha ela donde vier, infligida por mãos próprias ou alheias.. pura e simplesmente a dor.
Tento ficar ao largo de ti.
E não ir para casa onde nada me espera além de mim mesma neste esforço permanente de não me render ao cansaço e à decepção. Manobras de diversão. Exercícios de sobrevivência. Memórias a mais. Se calhar memórias que ocupam apenas espaço a mais à falta de mais recordações que lhes apaguem o brilho fiel do pó. Correr. Sempre. Para chegar. Para fugir. Para alcançar. Nem que seja nós próprios. Urge correr. Perdermo-nos nos movimentos lentos e esguios do coração. Não entender. Viver. Resistir. Mais que resistir. Ficar para ver acontecer. A imprevisibilidade que tem de existir para que nós sejamos. Adiados, andamos adiados.
Estranhamente. Vejo-te parado. Fiquei imóvel. Vi-te. Olhei-te. Fiquei. A lupa voltou.
Um minuto de sol que arde. Um dia de chuva que chora a alma. Quem vive pior? Quem ainda sonha? A lupa voltou e mostrou-nos que tudo fica igual.

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